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SÉRIE PROFESSORES: ENSINO EM TEMPOS DE PANDEMIA

TEMPO, TEMPO TEMPO

Anualmente, o mês de novembro é marcado por um grande evento do Dicionário Oxford: o anúncio da “Palavra do Ano”. Essa tradição evidencia o que está na mente das pessoas, podendo refletir sobre a população com luz positiva ou negativa. No entanto, em um ano atípico como 2020, peço licença poética aos grandes intelectuais para cravar a palavra da pandemia: tempo.

Penso nesta palavra como relevante para o contexto atual, pois acredito que ele, o tempo, nunca foi tão valioso como agora. O tempo passado insiste em nos lembrar de todas as coisas que não valorizávamos por serem triviais, mas agora nos causam grande saudade. O tempo futuro reserva a esperança de que, em breve, possamos nos aglomerar novamente e retornar à vida normal – ou, pelo menos, ao que for normal no mundo pós COVID-19.

Neste momento, quero usar parte do meu tempo para falar sobre o presente. Como professora da rede particular, encontrei-me entre a cruz e a espada tendo que me adaptar às repentinas mudanças no processo educacional, o qual foi reinventado em uma questão de horas. De repente, minhas salas de aula foram tomadas de mim e substituídas por um cantinho da casa, onde tento colocar quadro e contato físico numa tela de computador. Os rostinhos atentos (pelo menos de alguns) foram substituídos por nomes sem rosto que entram e saem da sala, e eu fico sem ter sequer a certeza de que realmente há alguém me ouvindo do outro lado.

Na rede privada, tenho o privilégio de acompanhar as mudanças de perto e opinar sobre o que podemos fazer para melhorar. Tenho acesso a recursos, assim como meus alunos. Diante disso, é fácil fechar os olhos e ignorar o outro lado da moeda. Diversos alunos da rede pública estão sem aulas e o cenário não se apresenta com possibilidade para melhora. É difícil falar em inovar quando não se tem recursos. Vivemos em um mundo com realidades díspares e a quarentena tem mostrado isso a todo momento (o próprio isolamento social já é um sinal de privilégio). É surpreendente a audácia do Ministério da Educação ao publicar um vídeo afirmando “o Brasil não pode parar”. O tempo agora é de reconhecermos os nossos privilégios e amenizarmos as desigualdades; reconheço as facilidades que tenho e não quero dificultar ainda mais a luta de quem não tem muito.

É claro que nem tudo é ruim. Com todas essas mudanças, nós, professores, estamos diariamente em adaptação: de nós mesmos e das metodologias de ensino. Implementar o ENP (Ensino Não Presencial) é uma luta diária com as conexões de internet instáveis, com os barulhos dos vizinhos, com o espaço limitado de alcance da câmera. E, quanto mais procurarmos, mais problemas surgirão. No entanto, quero falar também do carinho que tenho recebido dos meus alunos, da paciência enquanto construímos essa nova realidade.

Nos cursos de licenciatura, as modalidades de ensino são muito discutidas, mas a verdade é que pouco percebemos os impactos que elas têm sobre os alunos. O EAD (Ensino a Distância), por exemplo, é sempre visto como opção para quem trabalha, para quem mora longe e para vários outros “quems” que a faculdade nos apresenta. Entretanto, olhando a realidade atual, não consigo enxergar o EAD como uma ferramenta funcional no ensino básico. Escolher o EAD significa liberdade para escolher o horário de estudar e ter vários os vídeos disponíveis de uma vez, com todos os textos prontos para serem acessados. Parece muito bom, mas algo que não aprendi na faculdade, e que a quarentena me ensinou, é que isso não é suficiente. Alunos aprendem melhor quando estabelecem vínculos com o professor e conseguem criar uma rotina de estudos. É por isso que as escolas estão adotando o ENP, em que os alunos mantêm a rotina diária, semelhante à presencial, com aulas nos horários marcados e atividades conforme o desenvolvimento da matéria. Estamos levando as salas de aula para as casas de cada estudante (ou pelo menos tentando).

Talvez para alguns o EAD seja realmente a melhor opção, mas, para mim, enquanto professora, não abro mão de ter minhas turmas fixas, manter meus horários e poder contar com aquele “encontro” semanal para tentar normalizar a situação da melhor maneira possível. O cansaço é imenso e o trabalho é dobrado, mas a satisfação… essa é imensurável.

Espero, então, que, durante a quarentena que ainda nos resta, sejamos capazes de olhar ao nosso redor, mesmo que de longe, para agradecer por nossas oportunidades e tentar ajudar aqueles que não as possuem. Faça seu próprio tempo em casa para que ele realmente valha à pena!

Profa. Andreza Quitite

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